Vaca Profana

Respeito muito minhas lágrimas
Mas ainda mais minha risada
Escrevo, assim, minhas palavras
Na voz de uma mulher sagrada

Tomei a liberdade, por essas linhas tortas e brincando com a sua discografia, homenagear Gal Costa (1969) – cantora, compositora e multi-instrumentista baiana – um ícone da música brasileira que fez história nesse mundo de meu Deus, desde o início dos anos de 1960 e faleceu recentemente.

Foram 77 anos, dos quais 57, dedicados à uma carreira Estratosférica (2015) e Plural (1990), onde associou-se ainda jovem a nomes como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Tom Zé, Jorge Benjor e outros, em parcerias que até poderiam identificá-la como a Gal de Tantos Amores (2001).

Era dona de Caras & Bocas (1977), de um sorriso lindo e olhos que eram verdadeiro Espelho D’Água (2014/2018) que, sem dúvida nenhuma, foi resistência do começo ao fim. Se é que sua existência terá fim, pois ela foi e será sempre A Pele do Futuro (2018): polêmica na escolha do nome artístico, mudança de cidade, a dedicação na construção da carreira, os festivais, as sucessivas obras, a voz afiada, as premiações, a religiosidade e os propósitos de vida.

Poderia listar inúmeras qualidades para essa mulher Legal (1970), mas vou me ater a que considero mais relevante nesse momento e que ela fez questão de Cantar (1974) no álbum Profana (1984), que traz a música Vaca Profana e que os críticos dizem permitir aos ouvintes uma livre interpretação. Por isso cá estou eu no meu Bem Bom (1985) Mato Grosso, refletindo sobre Gal e Todas as Coisas e Eu (2003) que mobilizam a minha existência.

Assim como Gal e milhares de outras, sou dona de divinas tetas que são quase uma Aquarela do Brasil (1979). De perto não sou normal e acho que ela também não era! Seríamos então uma Fantasia (1981)? Assim como não podem ser normais as mulheres de diferentes idades, cores, raças, orientações, credos, ideologias, amores, profissões, lugares, classes, que cotidianamente precisam por seus cornos pra fora para enfrentar a manada contra o machismo e a misoginia.

Àqueles que são pouco afetos à leitura, ao conhecimento e ao debate das pautas civilizacionais eu esclareço: machismo e misoginia andam juntos e são indissociados. A misoginia é o ódio, a repulsa, a aversão doentia e o desprezo contra mulheres. Já o machismo é o preconceito que se expressa através de atitudes, opiniões contra a igualdade de direitos e de gênero, que se sustenta no patriarcado e na opressão de homens sobre mulheres. Ambos são tributários da violência e do feminicídio.

Por isso creio que mulheres como nós não somos normais. Somos sagradas mesmo! Somos aquelas que tem a capacidade de se rebelar em defesa da nossa condição, que compreendem que a vida pode ser o nosso bem ou o nosso mal, que podem ser tímidas e ao mesmo tempo fazer Aquele Frevo Axé (1998) para colocar o bloco na rua contra os caretas.

Minha Voz (1982), a voz de Baby Gal (1982) e de milhares de mulheres são onipresentes. Não adianta os caretas destilarem ódio, pois aqui a mulherada coloca O Sorriso do Gato de Alice (1993) no rosto e verte o leite bom da combatividade e do feminismo.

Gal será eterna! As mulheres estão aí! E os caretas vão para o lixo da história! Hoje (2005) ou Domingo (1967), assim será!

(*) LANE COSTA é Professora. Presidente Municipal do PCdoB/Cuiabá.

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