De carne e ossos

Mais um profissional de saúde tira a própria vida e muitos ficam perguntado o porquê . Todos nós,  que estamos nessa área e lidamos com a  dor e problemas a todo tempo , temos que estar mais atentos com nossos colegas de trabalho, eles dão sinais quando não estão bem .

A maioria de nós temos um ritmo muito intenso, com uma jornada de trabalho que fica entre 60 a 80 horas semanais. Associado a isso ter que lidar com  os problemas que cercam a vida pessoal de qualquer pessoa, como os trazidos pelos filhos , namorado (a) , parentes e amigos . Nem sempre há tempo de fazer atividades físicas e muito menos ter uma vida social mais ativa. O trabalho acaba se transformando em uma escravidão pois se  tenta  trabalhar mais pra ter maior conforto, mas nunca há tempo pra os pequenos prazeres da vida. Há sim uma ilusão de que um dia terá esse tempo , mas o momento nunca é o agora   .  

Assim, o fato de estarmos mais expostos nos deixam mais vulneráveis a patologias psiquiátricas , dentre elas a depressão. Não é incomum ter um número elevado de trabalhadores dependentes químicos, seja de álcool, cocaína, maconha ou mesmo medicamentos controlados como benzodiazepínicos. Falar disso incomoda e até tem muito tabu entre os profissionais. Justamente porque  há um inconsciente coletivo de quem trabalha na saúde é forte e não pode adoecer jamais. O outro pode , mas  o trabalhador da saúde não. Afinal quem vai cuidar daqueles que nós cuidamos?? 

Um grande erro pensar assim. Todos somos humanos e sujeitos a adoecer. É importante olhar pra seu colega sem  sua "capa" protetora ou o "cinto de utilidades". 

Super-heróis são apenas nos livros , desenhos e filmes. O nosso dia a dia é feito de carne e ossos.

A nossa vida é real e única. O valor que damos a ela pode ser influenciado pelo que o próximo nos dá como valor .

*WERLEY PERES é médico especializado em psiquiatria e ex-secretário de Saúde do município de Cuiabá.