*Juacy da Silva
O Tempo da criação 2024 está chegando ao seu final, qual o balanço que sua Igreja, Pastoral, movimento, organismo ou comunidade faz sobre esses 34 dias? Ano que vem (2025) tem mais. Cuidar das obras da criação, zelar pela saúde do planeta, por um melhor cuidado com a Casa Comum, deve ser um dever de todos os cristãos, leigos e também da hierarquia eclesiástica.
Conforme matéria do Site Tempo da Criação, este “é um tempo para renovar a nossa relação com o nosso Criador e toda a criação através da celebração, da conversão e do compromisso coletivo. Durante o Tempo da Criação, nos unimos às nossas irmãs e irmãos da família ecumênica em oração e ação pela nossa casa comum.”
“O Patriarca Ecumênico Dimitrios I proclamou 1 de setembro como um dia de oração pela criação para os ortodoxos em 1989. De fato, o ano litúrgico da Igreja Ortodoxa começa nesse dia com a comemoração de como Deus criou o mundo”.
“O Conselho Mundial de Igrejas foi chave para transformar isto em um tempo, estendendo a celebração do dia 1 de setembro a 4 de outubro. Seguindo a liderança do Patriarca Ecumênico Dimitrios I e o CMI, os cristãos ao redor do mundo abraçaram o tempo como parte do seu calendário anual. O Papa Francisco realizou a acolhida oficial deste tempo na Igreja Católica Romana em 2015”.
O início deste tempo que, como cristãos, católicos romanos, ortodoxos ou evangélicos, pouco importa nossa crença particular, tem início em 01 de Setembro, que é dedicado como sendo Dia Mundial de Oração pelas obras da Criação e a importância de um equilíbrio mais salutar entre a humanidade e a natureza, tendo em vista que boa parte ou a maioria dos problemas e tragédias ambientais, principalmente esta gravíssima CRISE CLIMÁTICA que estamos presenciando e sofrendo seus impactos, conforme tanto o Papa Francisco, na Encíclica Laudato Si e na Exortação Laudate Deum e também milhares de cientistas ao redor do mundo, principalmente os que participam do Painel Intergovernamental da ONU sobre as Mudanças Climáticas tem insistido e demonstrado, tem nas ações humanas (gananciosas, perdulárias e irracionais) a sua principal causa.
O encerramento ou o fim deste período reflexivo para a vida das Igrejas Cristãs ocorre em 04 de Outubro, que é o DIA DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS, padroeiro e patrono da Ecologia Integral, mesmo dia em que devemos celebrar o DIA DOS ANIMAIS e também o DIA DA NATUREZA.
Vale a pena destacar que ao longo desses 34 dias, o CALENDÁRIO ECOLÓGICO mundial e nacional destacam alguns dias como muito especiais, em torno dos quais, deveríamos nós, como cristãos e as Igrejas (Católica e Evangélicas) como instituições religiosas que, diariamente realizam eventos que congregam milhões de pessoas pelo Brasil afora, e bilhões no Planeta, aprofundar nossas reflexões e também nossas ações sociotransformadoras e, sem dúvida, estimular MOBILIZAÇÕES PROFÉTICAS, em defesa da Ecologia Integral.
Neste sentido, é oportuno mencionar os três pilares que sustentam nossas atitudes e formas de pensar, sentir e agir em relação ao que está acontecendo com o Planeta, nossa Casa Comum. Esses pilares são: Oração – ou seja, nossa espiritualidade ecológica (que é importante mas não exclusiva); Ações sociotransformadoras e, também, a Mobilização profética, que, como os profetas denunciavam as práticas injustas e pecaminosas, mas também anunciavam as boas novas, que nutriam a esperança de um novo tempo, desde que houvesse uma conversão e mudança de rumo, isto é o que estamos, atualmente, mais do que nunca precisando de um despertar da consciência ecológica tanto por parte de nossos governantes, quanto de nossos empresários, de nossas lideranças em todos os setores e áreas e entre as pessoas, a população, para que possamos mudar nossos estilos de vida, nossas relações de produção, de trabalho e de consumo, em que o respeito pela ecologia integral seja o paradigma fundamental deste novo modelo de sociedade e de economia.
A título de divulgação, visando contribuir para o conhecimento e importância desses dias especiais, relacionados com a ECOLOGIA INTEGRAL e que deveriam ou devem ser objetivo de nossas reflexões, neste TEMPO DA CRIAÇÃO, apresentamos a seguir esta relação, parcial, do Calendário ecológico.
Confrontando esta lista, seria interessante que indagássemos e pudéssemos responder, será que ao longo desses 34 dias tivemos oportunidade, não apenas individualmente, mas sim, como Igreja, o corpo de fiéis de refletirmos coletivamente sobre o que cada dia especial desses nos diz em termos da realidade socioambiental ou seja, será que, como cristãos estamos buscando formas e meios de melhor cuidarmos de nossa Casa Comum? O que fizemos em relação aos três pilares mencionados (oração – espiritualidade ecológica); Ações sociotransformadoras e Mobilização profética.
Quantas oportunidades tivemos em nossas pastorais, movimentos, organismos, escolas católicas, missas, reuniões etc. para refletir sobre cada aspecto desta realidade socioambiental que tem castigado nosso país?
Por exemplo, tivemos oportunidade ou realizamos algum evento sobre o Dia da Amazônia e a realidade triste e angustiante deste bioma que está sendo destruído de forma brutal? E sobre as queimadas, incêndios florestais no Pantanal, no Cerrado, na Amazônia, no Sudeste e no Nordeste fizemos alguma reflexão crítica e criadora como cristãos? E sobre o desperdício de alimentos, sem falar no desperdício de água, de energia e outros bens, que geram mais lixo e contribuem com aproximadamente mais de 12% da emissão de gases de efeito estufa e a crise climática.
De todo o alimento produzido no mundo, pouco mais de um terço vai parar no lixo, gerando um prejuízo de mais de um trilhão de dólares por ano, e poderiam alimentar no ano mais de 1,2 bilhão de pessoas, ou seja, acabar com a fome no mundo que atinge 788 milhões de pessoas?
E sobre o Dia mundial do ar limpo, a importância da qualidade do ar? Em 19 de Maio de 2023 a OMS – Organização Mundial da Saúde através de seu relatório sobre Estatísticas Sanitárias mundiais de 2022, alertava sobre poluição atmosférica informando que 99% da população mundial respira ar insalubre.
É estarrecedor quando o relatório da OMS informa que a poluição atmosférica foi responsável por aproximadamente 7 milhões de mortes em todo o mundo em 2016. Dessas, 4,2 milhões foram causadas pela poluição do ar ambiente. Enquanto o restante (3,8 milhões de mortes) foi causado pela exposição à poluição do ar interna, grande parte dela devido à fumaça de fogões improvisados, como os que usam lenha ou carvão.
Com certeza a situação é muito pior hoje, em 2024, principalmente no Brasil e outros países tanto da América Latina, quanto da América do Norte, África, Ásia, Europa e Oceania que estão sendo devorados pelos incêndios, pelas queimadas por meses seguidos, afetando profundamente a saúde humana e demais setores desses países.
Essas queimadas e fumaça aumentam a emissão de gases de feito estufa e com isso, colocam em risco a camada de ozônio que protege o planeta dos raios solares. Para refletir sobre isso foi criado o Dia Internacional para a Proteção da Camada de Ozônio. Será que este tema foi objetivo de nossas reflexões durante esses 34 dias do Tempo da Criação ou continuamos omissos, passivos e alienados como se nada estivesse acontecendo ou apenas implorando “aos céus” para nos socorrer?
Enfim, transcrevo a seguir esta lista dos eventos que constam do Calendário Ecológico durante o Tempo da Criação, enfatizando que o Calendário é anual, oferecendo oportunidades para que ao longo do ano, todos os meses, diversos dias especiais possam nos estimular a refletir e também a agir e a mobilizar em defesa da ecologia integral e de um melhor cuidado com a Casa Comum.
Setembro:01 Início do Tempo da Criação Dia Mundial de Oração pelo Cuidado da Criação; 03 Dia do Biólogo; 05 Dia da Amazônia; 07 Dia Mundial do Ar Limpo (Combate `a poluição do Ar); 11 Dia Nacional do Cerrado; 16 Dia Internacional de luta para a preservação da Camada de Ozônio; 19 Dia Mundial de luta pela Limpeza das Águas (ver também 22 de Março); 21 Dia da Árvore (ver também 21 de Março e 17 Julho); 22 Dia Nacional em defesa da Fauna; 29 DIA Internacional de Conscientização sobre Perda e Desperdício de Alimentos (Dia Internacional do Desperdício Zero). Ver também 30 de Março; 29 Dia Mundial dos Rios.
Outubro:01 Dia do Vegetarianismo; 03 Dia Nacional da Agroecologia; 04 Dia de São Francisco de Assis; 04 Dia da Natureza; 04 Dia dos Animais e Encerramento do Tempo da Criação.
Gostaria, ainda de destacar que em 03 de Outubro, é o DIA DA AGROECOLOGIA no Brasil, criado com a apresentação do Projeto de Lei de Autoria da Deputada Luci Choinaki, do PT/SC, em 2013 e aprovado pela Câmara Federal em 2014 e pelo Senado e Sancionada pelo então Presidente Temer em dezembro de 2017, como a Lei 13567, estabelecendo o Dia Nacional da Agroecologia e criando o Prêmio Nacional de Agroecologia Ana Primavesi, a pioneira nos estudos sobre o solo no Brasil e a primeira mulher a criar um Curso de Especialização sobre agricultura Sustentável, considerada pioneira da Agroecologia no Brasil, falecida em no início de 2020 com 99 anos.
É importante destacar que a agroecologia não é apenas um método ou uma técnica de cultivo agrícola, mas sim, um estilo de vida, para substituir um modelo de produção de alimentos que coloca o lucro acima da vida.
A agroecologia representa uma nova postura em relação `as questões da fome, da pobreza rural, da soberania alimentar, da sustentabilidade e leva em consideração os saberes ancestrais, as culturas locais e um maior cuidado e respeito com a natureza, com o solo, com a biodiversidade, com o equilíbrio dos biomas e ecossistemas, enfim, com a saúde humana e a saúde do planeta, tendo, neste aspecto também uma dimensão de espiritualidade.
A agroecologia estimula também além da produção sustentável e responsável, também o consumo com essas características, estimulando a solidariedade, formas cooperativas (economia solidária), tanto entre produtores quanto entre consumidores, promovendo a economia circular, a reciclagem, enfim, se aproximando da proposta do Papa Francisco contida na ECONOMIA DE FRANCISCO E CLARA, criando novos paradigmas que fundamentam uma ECONOMIA DA VIDA, em lugar dos modelos atuais que se caracterizam como ECONOMIA DA MORTE.
Assim, se ainda estamos no TEMPO DA CRIAÇÃO, podemos aproveitar este 03 DE SETEMBRO, dedicado ao DIA NACIONAL DA AGROECOLOGIA e realizarmos uma reflexão mais profunda sobre como estamos nos relacionando com a Casa Comum, quando o assunto e produção e consumo de alimentos saudáveis, orgânicos e como isto se relacionado diretamente com a SUSTENTABILIDADE e ao nosso Cuidado com o Planeta, a nossa Casa Comum.
É importante também, que o “espírito” e a mística do Tempo da Criação não fiquem restritos a apenas esses 34 dias, afinal, orar, refletir, agir, mobilizar em defesa da ecologia integral e as obras da criação devem fazer parte de nossa missão evangelizadora, diária e permanente, como cristãos, tendo em vista que, conforme o Papa Francisco tanto nos exorta, os gritos, os gemidos da terra são também os gritos, gemidos e sofrimento dos pobres, excluídos e oprimidos deste planeta, nossa Casa Comum.
Concluindo esta reflexão, pergunto a você, leitor, leitora, o que o tema e lema do Tempo da Criação deste 2024 provocou em você, em sua Igreja Particular, em sua comunidade, sua ONG, sua Pastoral, em suas preocupações com o futuro do planeta e da humanidade?
Apenas para refrescar a nossa memória, como cristãos, o Tema e Lema deste Tempo da Criação que estamos prestes a findar, foram/são: Esperançar e agir com a criação e As primícias da esperança, baseado este lema na Carta de São Paulo aos Romanos, capítulo 8:19 -25.
Para estimular a reflexão das Igrejas e dos cristãos, o site Vatican news (apresentou uma síntese sobre o atual estado da Casa Comum que, tomo a liberdade de transcrever, como a parte final desta reflexão/artigo “Os tempos em que vivemos mostram que não nos relacionamos com a Terra como um presente do nosso Criador, mas como um recurso a ser utilizado", afirma um comunicado do Movimento Laudato Si’, organizador da iniciativa. A Criação sofre devido ao nosso egoísmo e ações insustentáveis que a prejudicam, mas nos ensina que a esperança está presente na espera, na expectativa de um futuro melhor”
Em minha opinião, esta espera não pode ser mantendo uma atitude passiva, omissa, alienada de aguardar a chegada das tragédias, fruto da crise climática e outras formas como a Casa Comum está sendo destruída, mas sim, de uma luta, mobilização profética, continua contra a degradação e destruição do planeta, a partir dos territórios em que estamos inseridos.
Nesse mesmo sentido o Papa Francisco enfatiza que os cristãos devem estar e permanecer sempre ao lado das vítimas da injustiça climática, e que “No contexto bíblico, "esperar" não significa ficar parado e em silêncio, mas suplicar, clamar e lutar ativamente por uma nova vida em meio às dificuldades. A Criação e todos os seres humanos são chamados a adorar o Criador, trabalhando por um futuro dinâmico de onde possam surgir as primícias da esperança.
Que bom seria se, realmente todas as igrejas cristãs, católica romana, ortodoxa e evangélicas, tanto do Brasil quanto do resto do mundo tivesse uma visão da ecologia integral em uma dimensão mais crítica, criadora e revolucionária, no sentido de promover transformações significativas e profundas em nossos estilos de vida, causas maiores de todo este processo de degradação e destruição dos biomas e ecossistemas.
*Juacy da Silva, professor fundador, titular e aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia Integral. Email profjuacy@yahoo.com.br Instagram@profjuacy Whats app 65 9 9272 0052