O Sonho de Vicente

Vicente Emílio Vuolo, advogado, deputado estadual, prefeito de Cuiabá no período de 1962 a 1966), senador, foi um batalhador pela ligação ferroviária Cuiabá com São Paulo. Neto do comerciante italiano Francisco Altieri Vuolo e de Adalgisa Leocádia Rosa Vuolo, nasceu com um trem apertado em sua alma e fez de tudo para que o trem-de-ferro apitasse em Cuiabá, Várzea Grande, Coxipó, onde nasceu em 3 de outubro de 1929.

Enquanto o trem não chegava, Vuolo em 1957, tornou-se chefe de polícia do governador João Ponce de Arruda (1956-1961). Primeiro promotor de justiça em Cuiabá, ocupou também a Procuradoria da República no Estado e a Procuradoria Regional Eleitoral, além de ter sido membro do Conselho Penitenciário de Mato Grosso. Nas eleições de outubro do ano seguinte, elegeu-se deputado à Assembleia Legislativa do seu estado na legenda do Partido Social Democrático (PSD), assumindo o mandato em fevereiro de 1959. Em novembro de 1974, foi eleito deputado federal pelo Estado de Mato Grosso na legenda da Arena, assumindo o mandato em fevereiro de 1975. Nas eleições de novembro de 1978, foi eleito senador, assumindo o mandato em fevereiro do ano seguinte, após ter deixado em janeiro a Câmara Federal. Porém, Vicente continuava sonhando em ver o trem de ferro passar por Cuiabá.

Um dia Vicente Vuolo teve um tempinho para rever as brincadeiras lá pelas bandas do Coxipó da Ponte, em Cuiabá e confidenciou à jornalista Martha Arruda, falecida em 17 de julho de 2017, que viveu uma infância de menino pobre, onde “ nas horas em que não estava soltando papagaios, enchia as latas d’água para vender de casa em casa. Levava as latas dentro de carrinhos de mão. Com o dinheiro ganho podia ir ao Cine-Teatro Cuiabá ver filmes de Chaplim e Tarzan. O rio Coxipó ainda era limpo! Piscoso! Hoje, coitado, maltratado, cheio de esgoto. Jogava futebol com bola de meias velhas, com funda esticada onde, naquela época, matava passarinhos. Brincadeiras de crianças levadas que ainda não entendia sobre meio ambiente e preservação de animais. Ainda não tinha consciência da importância dos pássaros! Arrependo-me! confessou a Martha”.

Vuolo lembrou do seu primeiro carro. “Meu primeiro carro era uma Rural Willis caindo aos pedaços, com que corria pelas ruas de Cuiabá! Nessa época morava na rua Barão de Melgaço, esquina com a avenida Getúlio Vargas! ” Adiantou à jornalista que “Foi o professor Ranulpho Paes de Barros que o incentivou a seguir a vida política! A pé, de casa em casa pedia votos! Punha folhetos debaixo das portas. Se a família abrisse as portas e me mandasse entrar, expunha meus planos e metas! Assim fui eleito Prefeito de Cuiabá! ”

Duas vezes deputado: estadual e federal, Vicente foi incansável na luta pela chegada do trem-de-ferro a Cuiabá. “Comecei esta cruzada aos 20 anos! Infelizmente não ouvi o apito do trem em Cuiabá! ”. Mas vai chegar Vuolo! Calma aí no céu que ele está a caminho.

Lembrou que, no período em que foi prefeito, o orçamento da Prefeitura era de CR$100.000,00 (cem mil cruzeiros) e não recebia nenhum outro recurso, federal ou estadual. “ Quem me ajudou bastante foi o engenheiro Cássio Veiga de Sá, que colocou a pedra fundamental do prédio da Prefeitura, na Praça Alencastro; construiu o primeiro edifício de Cuiabá: o Maria Joaquina; construiu a ponte ligando Cuiabá a Várzea Grande, ao lado de João Ponce e construiu a Secretaria de Fazenda, o Tribunal de Justiça, o Colégio Estadual de Mato Grosso. ”

Lembrou de sua juventude e de suas vivências na UNE. “Comecei a fazer política na UNE – União Nacional dos Estudantes – aonde os mato-grossenses reuniam-se para discutir ideias sobre o País. Apoiou-nos muito Dr. Fernando Correa da Costa e Aníbal Pinheiro. Eu era presidente da Associação Mato-grossense de Estudantes e Aníbal, tesoureiro. A partir dali nenhum estudante mato-grossense dormia mais nas praias e ruas do Rio de Janeiro, como era comum! Abrigavam-se na AME! A rivalidade entre os mato-grossenses do Sul e Norte era grande! Só amenizou com a divisão do Estado! ” “A AME era frequentada por Benedito Santana da Silva Freire, Wlademir Dias Pino, Edmundo Lima de Arruda, Salomão Amaral, Rubem Figueiró, Manoel Cristiano de Miranda, entre outros. ” Dr. Aníbal Pinheiro está vivo e forte aí a testemunhar tantas andanças.

“Houve eleições em Mato Grosso e demos nosso apoio a João Ponce de Arruda, por avaliar seu forte papel quando foi Secretário Geral de Júlio Müller, Interventor do Estado. Praticamente, foi ele a grande cabeça daquela época! ”. “O senador Filinto Müller costumava ajudar aos cuiabanos que vinham estudar no Rio de Janeiro. Fui convidado a almoçar na sua casa da Praça Corumbá, sentado ao lado de dona Consuelo. Deu-nos quinze passagens para irmos votar em Cuiabá! Fomos votar no Ponce! Ao chegar, aguardavam-nos no aeroporto Luiz Altino, Edgard Vieira, Ranulpho Paes de Barros, Na Pinheiro, Léa Borges, ‘seu’ Frederico Campos e outros do PSD! ”.

O tempo passou. Vuolo casou-se com Leide da Costa Vuolo, pais de Gleide, Vicente Filho e Francisco Antônio Vuolo. Faleceu em 20 de maio de 2001.

Lá do alto ele deve estar feliz com as notícias das últimas semanas, pois o governo do estado de Mato Grosso retornou ao sonho de Vuolo, lançando edital de chamamento público para a construção da primeira ferrovia estadual em Mato Grosso. “ A ferrovia estadual é uma obra pioneira e histórica para o estado e vai interligar Cuiabá a Rondonópolis, bem como Rondonópolis com Nova Mutum e Lucas do Rio Verde, além de se conectar com a malha ferroviária nacional”, informou o governador Mauro Mendes, na imprensa local.

Que bom que o sonho do menino Vuolo vai se concretizar! Parabéns!

(*) NEILA BARRETO é Jornalista. Mestre em História. Membro da AML e atual presidente do IHGMT.

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